Por Breno César Carvalho de Souza*
“Uma realidade de desigualdade social que foge do que acreditamos ser espaço do outro, pois nega o direito e as condições necessárias à vida.” Conheça o testemunho do teólogo Breno Souza, que viveu uma experiência missionária na cidade de Pemba, Moçambique.
Em plena pandemia, numa região marcada pela guerra, aceitei o convite de estar, por três meses, na missão assumida pelos missionários Saletinos na Diocese de Pemba. Esta não foi a primeira vez que estive em Moçambique, pois já havia ido em 2014, a convite de Dom Luiz Fernando Lisboa, então bispo de Pemba. Desta vez, posso afirmar que o curso de teologia embasou ainda mais minha inserção missionária.
Cheguei em Moçambique dia 8 de março de 2021. De Maputo segui para Pemba, Província de Cabo Delgado. Fui acolhido de forma calorosa e fraterna pelas missionárias e missionários que lá estavam. Na casa onde fiquei hospedado, havia um cartaz escrito assim: “Bem-vindo à Diocese de Pemba, Terra de Missão”!
A língua oficial de Moçambique é o português. Contudo, há outras línguas predominantes nas ruas e aldeias da região de Cabo Delgado. A melhor maneira de se fazer entender é o respeito às pessoas e à cultura local, assim como ter boa vontade.
Há um dito popular: “este lugar é esquecido por Deus”, quando se refere a um lugar muito pobre, sofrido e abandonado. Mas Cabo Delgado e o povo moçambicano, certamente, não foram esquecidos por Deus, pois a realidade, quando é muito dura, é originada pelo esquecimento das autoridades e de grande parte da humanidade, com uma desigualdade social que foge do que acreditamos ser espaço do outro, pois nega o direito e as condições necessárias à vida. Este é, por si só, um desafio propriamente dito.
Entre os trabalhos que realizei na missão, destaco dois: o trabalho com fantoches junto às crianças nos reassentamentos, e o atendimento aos deslocados do ataque ocorrido na região de Palma, no dia 24 de março. A tarefa é preparar e servir as refeições para 300 pessoas abrigadas num simples ginásio de esporte.
Nessa experiência missionária, chamou-me muito a atenção “o olhar das pessoas”. O olhar das crianças expressa muita alegria, um brilho sem igual! Basta sorrir e elas sorriem de volta. Já no olhar dos adolescentes há uma mudança – sobretudo no olhar das meninas – marcado pela tristeza, pois estão compreendendo a realidade em que vivem e o futuro que as (os) espera. O olhar da pessoa adulta é um olhar profundo, expressa um grito silenciado pelas dificuldades enfrentadas: expressa dor. Não há vocabulário para explicar tamanho sofrimento.
A região de Cabo Delgado, além dos grandes problemas históricos de fome e pobreza, traz as marcas do ciclone de 2019, da malária, da febre tifoide, da cólera, da AIDS e outras tantas doenças que fazem parte da realidade dessas pessoas. Atualmente, a guerra na região Norte de Cabo Delgado tem ceifado vidas e deixado milhares de pessoas desabrigadas desde outubro de 2017. Pessoas que perderam o pouco que tinham. Por isso, o COVID-19 não está no topo das preocupações.
Foi marcante ouvir de uma pessoa que, para o povo moçambicano, “não há tempo para lamentação”, porque, mesmo que aconteça algo ruim (tragédia etc.), a pessoa tem que se erguer e enfrentar a vida e, mesmo na dificuldade e na dor, precisa viver um dia de cada vez.
Aprendi com o povo moçambicano “a teimosia de viver frente aos desafios mais diversos possíveis, enfrentando dia após dia a dura realidade”. Nesta “terra de missão”, nosso Deus solidário também sofre cotidianamente as dores do povo. Por isso, a missão tem o rosto contínuo e cotidiano da solidariedade!
É difícil definir minha experiência em Moçambique. Depois de tantas vivências e convivências, ficaram marcas profundas que levarei para a vida toda. Mas, com uma definição provisória, eu diria que foi impactante. Sim, impactante, no sentido de que tudo internamente fica suspenso, fora de lugar, e sujeito a uma reavaliação profunda e ressignificante da vida!
* Teólogo pela PUCPR, Curitiba
6 respostas
Parabéns, pelo seu serviço e doação missionária.
K Deus te abençoe sempre em sua missão Bruno…. tudo por missão..nada sem missão…
Seu testemunho de experiência e vivência em missão, juntamente com partilhas tão diversas; de irmãos sofridos devido as guerras, doenças e vulnerabilidade social.
Porém ricos em suas culturas, confiantes em transmitir esperança e, a alegria de um povo com olhares acolhedores. Assim, o seu testemunho!
Breno Saúde, que continue ao Servir e, partilhando as prioridades de irmãos tão longe, ao mesmo tempo próximo no que, as ajudas materiais podem chegar. Além do abraço virtual e unindo sobre as bençãos de Deus
E incentivo para sairmos no comodismo.
Parabéns pela sua missão, e com seu testemunho, mesmo que sem termos vivido essa experiência, podemos entender um pouco da desigualdade social e sofrimento que assolam um povo!
Parabéns! Tenho certeza de que essa vivência lhe trouxe muito aprendizado que serão utilizado em toda sua trajetória de vida!
Siga em frente!
O amor é a força motriz que impulsiona o nosso viver!
Através do seu testemunho a gente toma conhecimento da vida desse povo sofrido e acolhedor,parabéns pelo seu trabalho de amor para com o próximo,Deus o abençoe