Governo brasileiro fiscaliza mas não pune trabalho escravo

O Brasil tentou se defender da acusação de trabalho escravo na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) argumentando que o Estado não teria obrigação de indenizar por danos morais as violações na fazenda Brasil Verde, uma vez que elas foram cometidas por particulares e não pelo Governo diretamente. Foi uma tentativa que mostrou-se desastrada, uma vez que no sistema internacional, o Estado, ou seja, o Governo responsável por cuidar de seus cidadãos, vira réu e é julgado ao não prevenir as violações e não punir os culpados. E após 12 fiscalizações na Brasil Verde, em que foram encontradas irregularidades em todas elas, não há como o Estado afirmar que fez sua parte, aos olhos da Corte internacional. Assim, o Brasil foi julgado negligente.

A reportagem é de Regiane Oliveira, publicada por El País, 17-12-2016.

A defesa foi feita trabalho-escravo_divulgacao-mpfpela Advocacia Geral da União (AGU), a quem cabe defender o país em casos de litígios na Justiça. Do lado do Governo estava uma legislação forte, considerada uma das melhores do mundo. Desde 1940, o artigo 149 do Código Penal Brasileiro prevê pena de dois a oito anos para quem reduzir alguém a condições análogas ao de escravo. Em 2003, a lei foi ampliada, entrando outras disposições que tornam mais amplo combate ao trabalho escravo, como submeter alguém a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, condições degradantes, e restrição, por qualquer meio, da locomoção em razão de dívida contraída. A AGU usou a preocupação com o aperfeiçoamento da lei para se defender na Corte Interamericana.

Mas só palavras num papel não garantiram a eficácia da lei, concluiu a corte. O Governo fiscalizou a Brasil Verde diversas vezes, mas não aplicou suas próprias leis. E foi condenado por isso. De acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a sentença é inapelável e o Estado tem a obrigação de cumpri-la integralmente. No entanto, o Brasil ainda tem 90 dias para apresentar à Corte eventual pedido de interpretação, a fim de entender melhor o sentido ou o alcance da sentença. A AGU informou que analisará se haverá ou não necessidade de apresentação desse pedido.

“A AGU que foi tão combativa para defender a lei brasileira [durante o juízo internacional], deveria ser coerente também e aplicar a ação de regresso, pedindo uma indenização aos cofres públicos [ao autor do crime, no caso a Fazenda Brasil Verde] “, afirma Beatriz Affonso, diretora do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) para o Programa do Brasil. Na prática, isso significa fazer com que o proprietário da Fazenda, na sentença apresentado como João Luis Quagliato Neto, responsável pelo crime, restitua o valor a ser pago aos trabalhadores, de quase 5 milhões de dólares, ao Governo Brasileiro.

O El País perguntou à AGU se ela fará valer a ação de regresso, mas não obteve resposta. A medida viria de acordo com a decisão da CIDH, que ordenou que o Brasil tome diversas providências para garantir total reparação, dentre as quais, reiniciar as investigações.

Reflexão sobre escravidão na atualidade
90792a9a-8636-42ec-854b-c1425490e7d9O Cejil e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que foram responsáveis por apresentar o caso dos trabalhadores da Fazenda Brasil na Corte Interamericana, comemoraram a sentença. De acordo com Xavier Plassat, coordenador da Campanha de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo da CPT, a sentença fez uma ampla reflexão do que vem a ser escravidão na atualidade, reforçando o protagonismo da lei brasileira.

Assim como defende o artigo 149 do Código Penal Brasileiro, a CIDH reconheceu que o conceito de escravidão e suas formas análogas evoluiu e não se limita à propriedade sobre a pessoa. Os “atributos da propriedade” devem ser entendidos como o controle sobre uma pessoa que restrinja significativamente de sua liberdade individual, com intenção de exploração, obtido por meio de violência, fraude ou coação.

“Por isso, é importante não diminuirmos o padrão da lei que temos hoje”, lembra Beatriz. Atualmente, vários projetos de lei, propostos pela bancada ruralista, tentam mudar essa interpretação de escravidão, diminuindo a responsabilidade daqueles que hoje sequer pagam por seus crimes, como o proprietário da Fazenda Brasil Verde.

Fonte: IHU

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Relacionados

slot online situs slot gacor slot online slot gacor slot gacor situs judi slot gacor situs judi slot online situs judi toto slot gacor slot gacor judi slot slot online slot online judi slot slot gacor situs slot slot gacor 2022 slot gacor slot gacor slot gacor slot gacor slot gacor slot gacor situs slot gacor slot gacor https://cedu.uninorte.edu.co/wp-includes/ https://web.ics.purdue.edu/~asub/wp-includes http://blog.iconect.pctguama.org.br/ https://votoinformado.unam.mx/wp-includes https://epay.guaynabocity.gov.pr/epay/wp-includes https://reclamos.sistemasmlh.gob.ar/css/ slot pulsa slot deposit pulsa http://statconfig.sci.unhas.ac.id/assets/nexus-slot http://icob.sci.unhas.ac.id/nexus-slot/ https://www.aris.sc.gov.br/frontend/web/images/ https://aptta.org.ar/wp-includes/ https://icvb.org.tr/wp-includes https://filba.org.ar/images/ https://apps.santaisabel.sp.gov.br/ https://santaisabel.sp.gov.br/esd/ https://tzg.ttf.unizg.hr/wp-includes/ https://iif.edu/images https://mannaandbaby.or.jp/wp-content/uploads/slot-gacor/ toto slot gacor toto slot gacor toto slot gacor toto slot gacor toto slot gacor