Leiga missionária, Daniela Gamarra, fala sobre a missão em Moçambique

A leiga missionária Daniela Gamarra, 32 anos, natural de Gravataí (RS), na arquidiocese de Porto Alegre, acaba de regressar de uma experiência de cinco anos na missão além-fronteiras. A jovem esteve no distrito de Moma, na arquidiocese de Nampula, no norte de Moçambique, enviada pelo Projeto Igreja Solidária, mantido pela Igreja Católica do Rio Grande do Sul, que em breve completará 25 anos. Daniela recomenda: “quem tem vontade de se lançar numa missão ousada, não espere. Dê seu melhor para Deus, agora. O seu melhor para estar com as pessoas hoje, pois o fundamento da missão é servir sempre”. Confira entrevista concedida à assessoria de imprensa do Regional Sul 3 da CNBB.

Como despertou o desejo de ser missionária?
Diapositivo1Eu sempre tive o desejo de fazer missão, mas não sabia os meios. Em 2012 o pároco de minha paróquia, padre João Carlos (paróquia São Vicente Pai dos Pobres, de Gravataí – RS), se disponibilizou para ir em missão para Moçambique pelo Projeto Igreja Solidária. Com a saída dele veio o padre Maurício da Silva Jardim, hoje diretor das POM. Naquele período a paróquia se movimentou muito com a saída de um padre e a chegada de outro. Também despertou para a missão ad gentes. Na época meu envolvimento pastoral era com as crianças e passei a conversar sobre a missão com o novo pároco. Nisso reacendeu em mim aquela vontade guardada e vi como uma possibilidade de realizar meu desejo. Foram muitas reuniões, encontros com meu pároco e também conversas por e-mail com os padres João Carlos e Rodrigo Schüler de Souza, que estavam em Moçambique. Surgiu, então, a oportunidade de fazer parte da equipe.

Teve alguma preparação para ir em missão?
Discerni bem a vontade de ir para a missão com o padre Mauricio Jardim. Ele me apresentou à Comissão Missionária Regional (COMIRE). Participei de um encontro na sede do Regional Sul 3 da CNBB. Fiz um curso de preparação de 30 dias em Brasília (DF). Tive nesse curso uma base sobre o local e os cuidados com a cultura do outro. Embarquei para Moçambique em outubro de 2012 e ao chegar lá também participei de um curso para missionários que estavam chegando na arquidiocese de Nampula. Nesse curso obtive conhecimento da cultura, da língua e da história local.

Num primeiro momento, o que chamou sua atenção em Moçambique?
DSC04677São muitas realidades. Muitas coisas acontecem ao mesmo tempo, a vida é muito intensa. Num primeiro momento percebi a pobreza, a dificuldade das pessoas a ter acesso ao suprimento das necessidades básicas da vida. Eles vivem com muito pouco. Não tem móveis e a casa é muito precária. Chamou a atenção a simplicidade da vida deles. Vivem um dia após o outro.

Como foi sua acolhida?
Fui muito bem acolhida pelo povo. Eles acolhem bem porque se sentem atendidos e lembrados por Deus. Pedem sempre que o Projeto envie mais pessoas e que os missionários fiquem mais tempo, pois quando estão se acostumando com um padre, leigo ou uma irmã, já acabou o tempo e vão embora. É um povo sedento de pessoas que estejam com eles para ajudá-los num processo histórico de reconstrução e de se verem enquanto pessoas. A independência do país aconteceu cerca de 40 anos, mas ainda contam com a ajuda para crescerem nesse processo. Eles confiam muito na ajuda da Igreja.

Quais as dificuldades enfrentadas?
Apesar da língua e cultura diferentes o nosso português, às vezes, não era bem entendido. Tinha que usar palavras mais simples para ser melhor compreendida. Mas a maior dificuldade é ver as coisas que não estão certas e ser limitada para ajudar nas situações de doença, de pobreza, de injustiça. Essas foram as minhas dificuldades diante das necessidades de me sentir limitada. Nisso me deparei com minha própria limitação de mudar a realidade.

Os cristãos são minoria e há outras denominações cristãs e religiões. Como acontece essa relação?
Existem muitas denominações cristãs, como, por exemplo, evangélicos, adventistas. Mas em nossas paróquias a relação é entre cristãos católicos e muçulmanos. Em algumas regiões mais para o interior das nossas paróquias a relação é muito tranquila. Os muçulmanos participam de algumas de nossas celebrações na ocasião de casamentos, batismos. Costumam vir para testemunhar os filhos ou sobrinhos que estão recebendo os sacramentos. Costumam pedir ajuda da equipe missionária porque entres os muçulmanos não há solidariedade entre eles. Em algumas regiões litorâneas há grupos que entram em conflitos. Um exemplo disso é o que acontece com as jovens católicas recém batizadas que são procuradas pelos muçulmanos para casamento. Eles preferem as católicas e acabam tirando as meninas da Igreja. Trabalhamos isso na pastoral das mulheres. Os muçulmanos detém a maior parte do c10604522_10204831657495760_1424294462940103770_oapital, dominam o comércio e as moças pobres optam por se casar com os eles para melhorar sua condição de vida.

E a relação dos missionários entre eles e na arquidiocese de Nampula?
Na arquidiocese de Nampula há um número bastante grande de missionários brasileiros. Nós brasileiros costumamos nos reunir pelo menos uma vez por ano. Não só com os missionários de Nampula, mas também com os de outras dioceses vizinhas. Há uma entre ajuda missionária. Tivemos problemas com a falta de arcebispo e isso desarticulou bastante a pastoral a nível arquidiocesano.

E a equipe missionária do Regional Sul 3 da CNBB?
A equipe que continua no projeto conta com três padres e uma leiga. Eles estão muito bem e animados. Estão ainda se conhecendo, convivendo, pois não se conheciam. A fraternidade é muito importante e a equipe é o ponto seguro na missão. A união da equipe é importante para desenvolver o trabalho pastoral. Todos moram na mesma casa de cinco quartos, sala, cozinha, banheiro e capela. A equipe é responsável pelas tarefas de cuidado com a casa. Tirar água do poço, pois não tem água encanada e nem chuveiro. A arquidiocese de Nampula vê com bons olhos a nossa equipe missionária presente a mais de vinte anos. O povo e a arquidiocese agradecem muito a presença e colaboração.

Uma experiência que marcou durante os quatro anos na missão?
Conto uma experiência mais recente. Quando estava para retornar ao Brasil houve muitas manifestações, sobretudo, do grupo de mães que trabalhei com elas por um bom tempo vieram me dizer: “Agora como vamos ficar? Você era nossa mãe, nossa irmã e nossa amiga?”. Essa fala delas foi bem importante e me emocionou.

 Uma mensagem para os que deseja partir em missão ad gentes.
Antes de partir em missão eu pensava: ‘vou esperar primeiro terminar minha faculdade, comprar uma casa, adquirir alguma coisa. Vou esperar estar preparada, madura’. Mas pensei também diferente. Meus melhores anos de vida é agora. Então quem tem essa vontade não espere. Dê seu melhor para Deus, agora. O seu melhor para estar com as pessoas no tempo de hoje, pois o fundamento da missão é servir sempre!

Você gostaria de dizer mais alguma coisa?
Quero agradecer esse tempo pela confiança das pessoas lá da missão e daqui do Regional. Agradeço a todos que estiveram comigo tanto lá como aqui nesse período da minha vida. Quero agradecer imensamente a equipe que convivi ao longo dos quatro anos, porque deles são um pouco do que sou agora!

Entrevista concedida ao jornalista Judinei Vanzeto, da Assessoria de Imprensa do Regional Sul 3 da CNBB, dezembro de 2016. Publicada no site: www.cnbbsul3.org.br

Comentários

Uma resposta

  1. Conheci os combonnianos em a uns 10anos gostei muito mas não pude ficar na comunidade na época hoje estou cm 59 anos sinto o chamado e me identifiquei muito cm os leigos mas sabe sempre tem algo que me impede de fazer uma experiência mais profunda não sei se na minha idade seria aceita mas sinto um vazio imenso . gostaria de fazer uma experiência.

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