Dom Leonardo expressa seu compromisso com a evangelização e gratidão em sua homilia

O Verbo se fez carne e veio morar entre nós (…), e vimos a sua glória cheia de graça e verdade” (Jo 1,14).

As palavras de São João, agora ouvidas, nos deixam perceber o lugar do nosso nascer, do nascer da Igreja.

Nascemos da benevolência e da gratuidade do nascer de Deus. O nascer de Deus, na nossa humanidade e fragilidade, ilumina e transforma nosso existir. Ele, carne da nossa carne, sangue do nosso sangue, osso dos nossos ossos, liberta nossa humana fragilidade!

A Palavra que tudo criara, clareia a vida de toda a pessoa humana e a do universo, pois Ele é a luz verdadeira que, vindo ao mundo, a todos alumina (cf Lc1,9). Nascemos do nascer de Deus. Caiu a distância que havia entre Ele e nós, revelando-se Não-Outro de nós! (N. de Cusa). Sim, vimos a sua glória cheia de graça e verdade que nos encanta e desperta para seguimento da proximidade misericordiosa de Deus! (Sto Agostinho)

Na proximidade misericordiosa que nos atraiu, e fomos chamados pessoalmente para o seguimento: discípulos, discípulas. No Homem de Nazaré, já não somos gerados do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas gerados por Deus em Jesus, (Lc 1,12) pois nos ofereceu o poder, a graça de sermos filhos no Filho: filhos, filhas de Deus.

Gerados em Jesus Cristo e na força-suave do Espírito Santo, formamos a Assembleia dos seguidores e seguidoras de Jesus, a Igreja, as comunidades eclesiais. E as comunidades, na escuta da Palavra, na fração do pão e na ação vivificante do Espírito, visibilizam o Reino eterno e universal: reino da verdade e da graça, reino da justiça, do amor e da paz. (Prefácio Cristo Rei).

Igreja, Palavra, anúncio!

A Assembleia dos fiéis, a Comunidade Eclesial, na graça da eleição e da escuta percebe a razão de ser Igreja: anunciar testemunhar o modo de Deus entre nós. Jesus Cristo ao confiar aos apóstolos a missão de anunciar, testemunhar, também nos incluiu no envio: “Ide, pois, e fazei discípulos todos os povos da terra, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-os a observar tudo o que vos mandei.” (Mt 28,19-20). Ao entregar-nos essa missão, Ele acrescentou: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos”. Quase na provocação de sermos como Igreja, no hoje da história, a continuação de sua presença neste mundo. Sim, Ele está no meio de nós e nós o tornamos visível na tentativa de vivermos as suas palavras e obras. Ele em nós, e nós nEle. Ele no meio de nós!

A nossa igreja particular de Manaus, com nossas fragilidades e pecados, visibiliza o Reino anunciado e inaugurado por Jesus com sua vida, morte e ressurreição. O caminho percorrido por ela, indica o caminho da missionaridade, pois a razão de nosso existir nas pastorais, nos ministérios, nas estruturas, de vivermos em comunidades, só têm razão por sermos o anúncio da vida nova, da Boa nova.

O Diretório Pastoral da nossa Arquidiocese delineia a nossa presença e a nossa ação evangelizadora e o Plano de Evangelização indica a via, o rio da nossa ação como igreja missionária. Quanto esforço para sermos uma presença transformadora! Quanto esforço para sermos fermento e luz na realidade que se apresenta desigual, violenta, desiquilibrada social e ambientalmente!

O Diretório e o Plano desejam uma Igreja missionária, onde todas as estruturas e relações sociais estejam pervadidas pelo modo do Evangelho. Uma Igreja que cuida dos ministérios, das relações ecumênicas e inter-religiosas, da arte, da educação, dos meios de comunicação, da política, da justiça; uma igreja que insiste para que todas as irmãs e os irmãos, envolvidos nessas dimensões de nossa sociedade, ajudem na transformação das nossas realidades, para vivermos em fraternidade, na liberdade, na justiça, em paz. Mas também, pedem que não nos esqueçamos que Ele está no meio de nós e que, em tudo, o fundamental é a caridade. Sem ela, tudo é vazio e perde o sentido (Dom Sérgio Castriani). Pois “de sua plenitude todos nós recebemos graça sobre graça. A graça e a verdade vieram por Jesus Cristo.” (Lc 1,16)

Os bispos do Brasil, através das Diretrizes da Ação Evangelizadora, oferecem às dioceses e prelazias pistas para uma evangelização fecunda e eficaz: sermos uma igreja missionaria.

A missionariedade é a razão de ser da Igreja, é o seu fundamento, é a sua identidade. A Igreja existe para evangelizar. Evangelizamos, porque somos Igreja; porque somos igreja, evangelizamos. Os nossos cuidados, as nossas ações, nossos ministérios, as nossas organizações são tentativas de cumprirmos a missão que Jesus nos presenteou: “Ide pelo mundo inteiro e proclamai o Evangelho a toda a criatura” (Mc 16,15). E nós iremos, sairemos, encontraremos e ofereceremos a presença transformadora do Evangelho. E ofereceremos sem temor, pois Ele está no meio de nós! Uma igreja missionária, comunidades missionárias.

Palavra de Deus

A missionaridade salta do silêncio-força da Palavra. “Quando encontrei tuas palavras, alimentei-me; elas se tornaram para mim uma delícia e a alegria do coração, o modo como invocar teu nome sobre mim” (Jr 15,16). Ela fecunda as nossas vidas, a vida de nossas famílias, a vida de nossas comunidades. Ela nos desinstala, nos envia. A missão recebida será possível se receptivos à suavidade-vigor da Palavra de Deus. Ela gera e alimenta as comunidades, das famílias, a vida pessoal. Ela perpasse todas as nossas ações e decisões!

Como sermos Igreja, sem a Palavra de Deus? Sem escutarmos a Palavra, sem vivermos a Palavra, sem anunciarmos a Palavra: Jesus-palavra, Palavra-Jesus. Sem concebermos e sem darmos à luz a Palavra que armou sua tentada entre nós (Francisco de Assis).

Ouvida, meditada, partilhada e celebrada, a Palavra de Deus gera solidariedade, justiça, reconciliação, paz, consolo, acolhida, perdão, cuidado da casa comum.

Se Ela criou o céu e a terra, o que não fará com aqueles e aquelas que a buscam e dela se alimentam?

Talvez, diante da hemorragia das palavras, sejamos despertados para o silêncio da Palavra que gera palavras novas, desviando-nos das novidadeiras!

Iniciação à vida cristã

Despertada pela Palavra, desejosa de seguir Jesus-Palavra, a comunidade missionária inicia seus novos membros na vida de Jesus.

A iniciação à vida cristã é um modo eficaz de evangelização na realidade da ciência e da técnica, em que vivemos. Iniciarmos os irmãos e as irmãs na alegria do Evangelho, na gratuidade do amor pendido da cruz, da vida nova que vence o medo e a morte. Sermos uma comunidade missionária que introduz os membros na beleza e na sabedoria de seguimento de Jesus.

“Anunciar Cristo significa mostrar que crer nele e segui-lo não é algo apenas verdadeiro e justo, mas também belo, capaz de cumular a vida dum novo esplendor e duma alegria profunda, mesmo no meio das provações” (EG, n. 167).

Comunidades missionárias que celebram

Uma Igreja missionária escuta, vive e celebra. Os discípulos missionários vivemos a fé em comunidade (1Pd 2,9-10) (LG, n. 9) na íntima união e comunhão com a Trindade Santa (CNBB, Doc. 100, n. 170). Ao celebrar, ela acolhe, forma, transforma, restaura, adverte, sustenta, consola, une, reconcilia e envia em missão. Nossa escuta, louvação, petição, ação de graças nascem da benevolência irradiadora de Deus. As nossas celebrações são participação da magnanimidade e expansividade amorosa de Deus. Ofertamos as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias, (GS 1) e somos alimentados pela Palavra e pela Eucaristia; confortados e fecundados pela graça dos sacramentos. Somos comunidades, Comunidades Eclesiais de Base, pequenas comunidades que sabem bendizer, louvar, interceder, celebrar. Ao celebrar testemunhamos!

A caridade, o serviço da vida plena para todos evangeliza

“Vós sois as testemunhas destas coisas. Eu enviarei sobre vós aquele que meu Pai prometeu” (cf. Lc 24,48-49). Uma igreja missionária, uma igreja da caridade, uma igreja misericórdia, uma igreja em saída busca as periferias geográficas e existenciais para oferecer o Evangelho da vida, a vida plena. Nossas comunidades a serviço da plenitude da vida, pois tudo feito por meio de Jesus-palavra, pois sem ele nada foi feito de tudo o que foi feito. Sim, nele há vida, e a vida é a luz do universo. (cf Jo 1,3-4)

Por isso, a Comunidade missionária cuida de todo ser criado, de todo filho e filha de Deus, mesmo os que vivem na escuridão do pecado, da morte, da violência. Ela vai a procura dos abandonados, excluídos, descartados e ignorados em sua miséria e dor e oferece o dom da justiça e da fraternidade, do consolo e da caridade, o dom da reconciliação e da paz (cf. DAp, n. 358).

Nós, como Igreja, somos atraídos pela força dos pobres, carne de Cristo Jesus e os servimos (Papa Francisco). Por isso, talvez, estejamos mais necessitados de espírito: espírito de partilha, de cuidado, de solidariedade, de justiça, de paz, de concórdia, de fraternidade. Tenho às vezes a percepção de que estamos doentes no espírito; a nossa alma apequenou-se. A violência nos assusta, mas nos provoca a oferecermos o diálogo, a paz, a reconciliação, o afeto da irmandade. O Evangelho nos ensina que a violência não se supera com as armas e a repressão, mas com cultura, educação, saúde, políticas públicas, justiça social, cuidado da casa comum, solidariedade, dignidade, arte. Sim só o amor é capaz de devolver a integridade da alma, um novo espírito.

Nossa presença, como Igreja, nas diversas realidades da sociedade, vem da certeza transformadora que a presença da Palavra criadora oferece. Com perseverança e teimosia, participamos das dores, dos sofrimentos, das injustiças, do descaso, do nosso povo oferecendo vida nova, relações novas, nova justiça, vida nova do Evangelho. É o amor gratuito que plenifica, faz antedegustar, no vale de lágrimas, a eternidade.

Jesus Cristo entre nós abriu olhos, soltou línguas, estendeu mãos secas, devolveu mortos com vida, limpou leprosos e os devolveu à sociedade: doenças do corpo e do espírito. E nós?

Como é bom recordar as palavras de São Paulo VI: “O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres, ou então, se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas” (EN, 41).

Aguardamos, de coração aberto, as orientações do Magistério do Papa Francisco para a Pan-amazônia. Desejamos ser uma igreja na dinamicidade da Exortação pós sinodal que Papa Francisco nos enviará: Uma Igreja viva e vivaz, inteligente, capaz de ver as necessidades e buscar soluções, em favor dos povos indígenas, dos povos originários, da obra criada.

Na Bula de minha nomeação, ele me recordou que o tempo de meu ministério deverá ser o tempo do Sínodo e da sinodalidade.

Gratidão!

Ao receber o cuidado pastoral da arquidiocese, em meu coração, nascem palavras de gratidão.

Gratidão aos irmãos e irmãs que, no passado, buscaram e, no presente, buscam viver da Boa Nova que é Jesus, testemunhando a presença do novo Reino;

Gratidão às lideranças, aos ministros e ministras das nossas comunidades que animaram e fortificaram, animam e fortificam a fé das nossas comunidades: igreja;

Gratidão às pastorais que visibilizaram e visibilizam a misericórdia no meio da nossa sociedade, tornando a nossa igreja sempre mais com o rosto de Deus que se compadece do órfão e da viúva;

Gratidão aos movimentos do passado e do presente que, inseridos na vida eclesial, ajudam na animação do Evangelho;

Gratidão às religiosas e aos religiosos do passado e do presente que entregaram suas vidas para ajudarem na formação da nossa igreja particular e em favor do reino de Deus e sua justiça;

Gratidão aos nossos diáconos permanentes que ajudam no anúncio, na celebração e no testemunho;

Gratidão aos nossos presbíteros do passado e do presente que, deixando a sua terra, aqui vieram para anunciar e testemunhar o evangelho da vida edificando a nossa igreja particular;

Gratidão às nossas igrejas que nos enviam padres e ajuda econômica;

Gratidão aos nossos presbíteros, aqui nascidos, que constituem, hoje, a base do nosso presbitério, demonstrando a capacidade da igreja de gerar ministros e ministérios.

Gratidão aos bispos e arcebispos que cuidaram a grei do Senhor com sabedoria ao modo do Bom Pastor; aos bispos auxiliares do passado e do presente pela dedicação na presencializacão do Servo Jesus.

Deus abençoe e fortaleça a todos, pois o Evangelho pede de cada um de nós trabalho, serviço, dedicação, disposição, disponibilidade e gratuidade para a visibilização da vida de Jesus A dedicação do passado será nossa força no presente.

Gratidão a Dom Sérgio, nosso arcebispo agora emérito, que serviu a nossa igreja, durante os últimos anos. Deus seja louvado e bendito pelo seu serviço e ministério episcopal entre nós! Agradecemos a oferta de sua vida, fisicamente limitada, à nossa Igreja de Manaus. Todos lhe agradecemos, Dom Sérgio, por permanecer entre nós.

Gratidão ao Papa Francisco por ter-me enviado para a Amazônia! Quantas vezes ele manifestou sua preocupação pastoral e a preocupação com a casa comum em relação a Amazônia, durante as visitas da presidência da CNBB (Cardeal Raimundo Damasceno Assis e do Cardeal Sérgio da Rocha).

A Arquidiocese de Manaus fará todo o esforço para cuidarmos da Amazônia, nossa casa comum e de seus povos originários conforme a solicitude do Santo Padre.

Com São Paulo rezemos:

Pai, damos graças, pois nos tornaste dignos de participar da herança dos santos, na luminosidade de teu amor. Tu nos livraste do poder das trevas, transferindo-nos para o reino do teu Filho amado; nele recebemos a graça da redenção e do perdão dos pecados.

Jesus, que és a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, somos partícipes da tua primogenitura;

Fecunda-nos com a força do teu espírito criador e criativo, pois em ti foram criados todos os seres visíveis e invisíveis, tronos, dominações, principados, potestades; tudo foi criado por ti e para ti, recria-nos no teu amor;

Tu, que existes antes de todas as coisas e em ti todas as coisas têm consistência, concede-nos o dom de existir em ti e que tudo seja transformado no vigor de tua salvação;

Tu, que és a nossa cabeça amorosa-pensante, pois somos Igreja, ajuda-nos a ser presença libertadora;

Tu, que és o princípio, Primogênito dentre os mortos e que, em tudo, tens a primazia deixa que vivamos para ti e em ti;

Ajuda-nos, Jesus, purificar e maturar nossa vida eclesial, pois em ti habita toda a plenitude e, por ti, tudo foi reconciliado;

Tu, que nos doaste a paz pelo sangue derramado na cruz, concede-nos a teimosia de permanecermos no caminho da irmandade;

Senhor, no tempo da alma pequena, do espírito esvaziado, concede-nos alma generosa, ânimo novo, vigor do espírito, alegria de crer em ti, presença misericordiosa!

Deus seja louvado e bendito para sempre!

Amém.

Leonardo Ulrich Steiner

Arcebispo de Manaus

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